Acidentes no local de trabalho
Os acidentes de trabalho são acontecimentos inesperados que ocorrem quando menos esperamos, mas para os quais as entidades empregadoras devem de estar preparadas, nomeadamente ao nível dos seus seguros, nesse seguimento iremos analisar o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 7 de janeiro de 2016.
Tudo surgiu na sequência de uma acção especial emergente de acidente de trabalho, em que os Pais de um sinistrado intentaram esta acção contra a entidade empregadora e a companhia de seguros, uma vez que o seu filho acabou por falecer após uma queda no local de trabalho, pugnando estes:
a) a quantia de €155.242,74 a título de pensão vitalícia;
b) a quantia de €85912,75 a título de capital de remição;
c) a quantia de €50.000 a título de danos não patrimoniais;
d) a quantia de €70.000,00 a título de dano morte/direito à vida do seu filho;
e) a quantia de €15.000.00 a título de dano sofrido pelo sinistrado entre o acidente e a morte.
Consequentemente, alegaram que o seu filho foi vítima mortal de uma queda quando se encontrava a realizar o seu trabalho ao serviço da entidade empregadora, responsabilizando a entidade empregadora pela falta de condições de segurança no trabalho e por falta de implementação das medidas adequadas ao trabalho a ser realizado.
Com o andamento dos autos, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, considerando que:
A) absolve-se Entidade Empregadora dos pedidos contra si formulados.
B) condena-se a Entidade Empregadora e a Companhia de Seguros, S.A., a pagar:
I. à Autora Mãe:
– o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia, devida desde 28.10.2016, no montante de €1312,65, acrescidos de juros de mora desde essa data até integral pagamento.
II. ao Autor Pai:
– o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia, devida desde 28.10.2016, no montante de €1.312,65, acrescidos de juros de mora desde essa data até integral pagamento.
No mais, vai a Ré seguradora absolvida do que vinha peticionado pelos Autores.
Não concordando com esta decisão a Seguradora recorreu da sentença, tendo o Tribunal relativamente ao acidente concluído que:
“14. Naquele dia, no período da manhã, o sinistrado esteve a realizar trabalhos ao nível do solo que consistiam em amarrar as chapas e ajudar a içá-las para o telhado;
15. No dia do acidente, a entidade patronal não entregou ao sinistrado o arnês necessário à protecção de riscos de queda em altura;
16. No dia do sinistro, antes de iniciarem os trabalhos, o encarregado da obra, transmitiu ao sinistrado que a sua tarefa era engatar chapas que se encontravam depositadas no solo, para serem guindadas para a cobertura pelos seus colegas;
17. E que, para esse efeito, devia permanecer sempre no solo;
18. Estando proibido de subir à cobertura do edifício e ao andaime existente no local, que permitia o acesso à referida cobertura.
(…)
24. Sucede que, a dada altura, o encarregado da obra teve necessidade de se afastar, momentaneamente, do local onde se encontrava o sinistrado;
25. E, por circunstâncias e motivos não apurados, o sinistrado subiu à cobertura do edifício;
26. Tendo caído, de seguida, de uma altura de cinco metros, através de uma placa de fibrocimento que terá quebrado.”
Em sede de sentença ficou decidido que o acidente ocorrido seria decorrência do trabalho, uma vez que “o sinistro ocorreu no local (considerando a natureza da actividade prestada pela entidade patronal do sinistrado, enquadra-se aqui a execução dos serviços fora da sede da empresa, mas numa obra que lhe foi adjudicada) e tempo de trabalho (…)”, posição que o Recorrente discordou, afirmando que o acidente não seria um verdadeiro acidente de trabalho.
O caso foi assim analisado aos olhos da Lei 98/2009, de 4 de setembro (LAT), que regulamenta o Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profissionais, o qual dispõe, nos termos do art.º 8 que acidente de trabalho é “aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho e produza directa ou indirectamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte.”
O Tribunal da relação trouxe ainda à colação o Acórdão do STJ de 16/09/2015, do Processo 112/09.5TBVP.L2.S1: “Independentemente das querelas doutrinárias atinentes à sua exata delimitação, pode afirmar-se, grosso modo, que o acidente de trabalho consiste sempre num evento danoso que, entre outras características, apresenta determinada conexão com a prestação do trabalho.”
Em sede de decisão, concluiu o presente recurso que “para a pretendida descaracterização, não basta a prova da mencionada proibição e desobediência à mesma, pois que, para tanto, necessário seria que lhe tivessem sido transmitidas as razões de tal proibição já que, só assim, teria o sinistrado a consciência da concreta perigosidade da violação da proibição.
Podendo-se, pois, dizer que o sinistrado, voluntariamente, desobedeceu à ordem que lhe foi dada, violando a mencionada proibição, não se poderá contudo dizer, uma vez que isso não resulta da factualidade provada, que soubesse ou tivesse consciência de que essa proibição teria a ver ou teria como causa a protecção da sua segurança por:
i) as concretas condições de segurança da cobertura o deverem impedir de a ela subir (designadamente sem se munir de arnês de segurança), o que não foi também alegado, assim como não foi alegado que tal lhe tivesse sido transmitido, para além de que nada se provou quanto às condições de segurança implementadas no local:
ii) e/ou que existiriam razões atinentes ao próprio sinistrado que impediriam a subida à cobertura.”
Notamos e evidenciamos que esta ponto é de manifesta importância e reforçado pelo Acórdão do STJ de 17/02/1999: “se ao trabalhador foram atribuídas certas tarefas e vedada a realização de outras, o acidente sofrido em execução das últimas não descaracteriza o acidente se não se provar que aquela proibição visava objectivos de segurança”.
Assim e pelos motivos invocados, até nas respostas a alguns dos artigos da contestação se considerou que o acidente em si devia ser caracterizado como acidente de trabalho e por isso não teve provimento o recurso intentado pela Seguradora, confirmando-se assim a sentença recorrida e acima transcrita.