Análise do Ac. STJ de 09-01-2019 – Da presunção de laboralidade
I – Introdução
Para uma melhor compreensão do tema em análise, vamos começar por esclarecer o que é e em que consiste a presunção de laboralidade.
Assim, o Dr. João Leal Amado, de uma forma simples e directa dá-nos uma definição deste conceito: “Presume-se que existe um contrato de trabalho sempre que o prestador esteja na dependência e inserido na estrutura organizativa do beneficiário e realize a sua prestação sob as ordens, direcção e fiscalização deste, mediante retribuição”.
Na prática isto significa que há situações em que embora não haja um contrato de trabalho assinado, pode presumir-se a existência do mesmo, desde que se provem os elementos que a lei exige para tal e que acabamos de referir, que constam no artigo 12º do Código de Trabalho.
Posto isto, estamos em condições para explicar o conteúdo deste acórdão.
II – O caso concreto
O Autor, intentou uma ação contra a Ré, empresa para a qual prestou trabalho no período entre 15 de agosto de 2007 e 28 de maio de 2015, alegando para o efeito que desempenhou funções de instrutor de ginástica, sob a direcção e ordens da mesma, utilizando os meios e instrumentos de trabalho da Ré nas suas instalações, comunicando e justificando as suas faltas, e que era a Ré que fazia a marcação das aulas e controlava o seu trabalho.
Contudo, foi dispensado do exercício das suas funções no dia 8 de maio de 2015 e não lhe foi pago qualquer valor a título de subsídio de férias e de Natal, nem o valor respectivo a esse mês de trabalho.
Pelas razões expostas, veio pedir que fosse reconhecida a relação laboral com essa entidade, alegando para o efeito que trabalhou para a Ré em regime de exclusividade durante todo o período de duração do contrato.
Pediu também que a Ré lhe pagasse os montantes relativos a subsídios de férias e de Natal, bem como os meses de maio e junho de 2015 e por último alegou a ineficácia da decisão da Ré por ter sido unilateralmente tomada e, em consequência, pediu uma indemnização em substituição da reintegração, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, até que se verificasse o integral pagamento.
A Ré contestou, alegando até a figura do abuso do direito no que se refere às somas pedidas pelo Autor e, em sede de julgamento, o tribunal a quo deu-lhe razão, absolvendo-a do pedido e julgando a ação totalmente improcedente.
O Autor não se conformou com a decisão e recorreu requerendo que se alterasse a decisão sobre a matéria de facto, sendo que em sede de recurso a ação foi julgada parcialmente procedente, reconhecendo que a relação entre Autor e Ré se tratava de um verdadeiro contrato de trabalho, sendo devidos os subsídios de férias e Natal e ainda a indemnização em substituição da reintegração pela Ré, sendo absolvida dos restantes montantes pedidos.
Desta feita foi a Ré que não se conformou com a decisão e, recorreu para o Supremo, pedindo a revogação do acórdão recorrido, invocando para tal a violação de várias normas jurídicas.
III – Factores relevantes para a fundamentação
O Tribunal considerou como relevantes para a sua decisão os factores que passamos a expor:
- No que se refere ao horário, ficou provado que era a Ré que o elaborava, de acordo com a disponibilidade do Autor;
- O Autor não exercia esta atividade esta actividade em regime de exclusividade;
- Era o Autor que geria as suas marcações, indicando a sua sua disponibilidade e horários em que poderia trabalhar para a Ré e aceitava ou não treinar os clientes que eram angariados pela Ré;
- No que toca à remuneração, o Autor era pago, mediante a emissão de recibos verdes pelo número de horas que tivesse trabalhado;
- O Autor podia também apresentar um substituto quando não pudesse comparecer ao trabalho e era também ele que organizava e agendava as suas férias, apesar de com a remarcação ter de evitar a marcação em determinados meses;
- O Autor não recebia nem subsídio de férias e nem de Natal.
IV – A decisão
Apreciados todos os elementos que considerou relevantes para a boa decisão, o STJ pronunciou-se no sentido de não se provar a presunção de laboralidade ou presunção de existência de contrato de trabalho e, portanto, a conclusão foi a de que não existe contrato de trabalho entre as partes.
Em vista disso, repristinou-se a decisão do tribunal de primeira instância, sendo o Autor condenado a pagar as custas do recurso de apelação e de revista.
V – Conclusão
Pelo que vemos, a bem dizer há vários contratos sem contrato, no entanto, a presunção de laboralidade está sujeita ao escrutínio das normas do artigo 12º do Código do Trabalho e mais sujeita está ao ónus de prova de quem a alegar em prima facie, cabendo depois àquele contra quem a invocação é feita provar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado.