Partes comuns em propriedade horizontal e responsabilidade sobre as mesmas
Artigo sobre acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07/01/2019, proc. 5568/15.4T8MTS.P1 – pelas obras de reparação da sua varanda, de molde a que esta não causa danos às partes comuns, mormente à cobertura, ou à fração de outros condóminos, é apenas responsável o condómino que é titular da fração de que faz parte a dita varanda.
Vejamos os factos do caso do acórdão em apreço.
Os AA. pedem a condenação do R. para proceder às obras de impermeabilização do terraço da sua fração, e a respetiva indemnização pelos danos causados por infiltrações decorrentes do imóvel deste último.
Sucede que no ano de 2010 a administração daquele condomínio mandou aplicar telas que evitassem as infiltrações. No entanto, o próprio estado do terraço do R., que tinha, nomeadamente, rachadelas, impedia o correto escoamento das águas, provocando a sua acumulação e consequente infiltração e demais consequências de degradação na fração dos AA, intensificando-se os problemas principalmente nos dias de chuva. Assim os AA. totalizaram a quantia € 7.269,50, sendo € 5.719,50 a título de reparação de danos, e € 1.250,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Em sede de contestação, o R. alega a prescrição do direito invocado pelos AA e que o prédio comporta problemas de infiltração há vários anos, ao que acrescenta que o terraço tem efeito de cobertura e que por isso é parte comum do edifício, uma vez que figura como elemento de proteção no interesse coletivo, pelo que compete à administração das partes comuns, à assembleia de condóminos e ao respetivo administrador a realização de obras em zona comum ainda que aquela seja de uso exclusivo.
No exercício do contraditório, os AA. alegaram, a final, que os encargos de conservação e fruição são despesas relativas às partes comuns do prédio que sirvam de forma exclusiva apenas alguns dos condóminos ficam somente sob a sua responsabilidade e entendem ainda, segundo documentos por si juntos, que o terraço não figura do título constitutivo, tendo sido construído posteriormente, devendo por isso ser demolido, aumentando assim o pedido feito em sede de petição inicial.
Foi julgada improcedente a exceção de prescrição invocada pelo R. e a ação parcialmente procedente, tendo o R. sido condenado a realizar as obras de impermeabilização do terraço da sua fração, bem como ao pagamento aos AA. do montante de € 6.070,25 acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%, sendo absolvidos do pedido ampliado feito em sede de exercício do contraditório.
No referido acórdão são abordadas questões de direito adjetivo e subjetivo, sendo que no presente artigo incidirei apenas sobre a parte do direito subjetivo por entender ser a mais relevante. Assim, estão em crise os seguintes artigos:
- 335.º do CC – colisão de direitos
- 1421.º n.º 1 al. b) e c), e n.º 3 do CC – partes comuns do prédio
- 1424.º n.º 3 do CC – encargos de conservação e fruição
- 1427 n.º1, 3 a 5 do CC – reparações indispensáveis e urgentes
- 1430.º do CC – órgãos administrativos
Nesta senda, entendeu aquele Tribunal da Relação:
- que o que está realmente em causa in casu, não é a cobertura conforme alegado pelo R. ao abrigo do art. 1421.º al. c) do CC, mas sim a falta de condições da varanda daquele, que é parte integrante da sua fração e a falta de condições da mesma, que faz com que se infiltre água na fração dos AA.
- posto isto, nenhum cabimento tem o art. 1430.º do CC referente às partes comuns do prédio, porquanto, a impermeabilização nenhuma relação tem com a cobertura da fração, sendo que são as respectivas obras para impermeabilização do terraço que os AA. pretendem ver satisfeito.
- assim sendo, apenas é responsável o condómino proprietário da fração a que corresponde aquele terraço, não estando – repete – em causa partes comuns, mas sim a fração do R.
- deste modo, não há qualquer aplicabilidade dos arts. 1424.º e 1427.º, nem está aqui presente a colisão de direitos alegada pelo R., pelo que não há qualquer responsabilidade do condomínio e respetiva administração.
- uma vez que o terraço é da fração cuja propriedade pertence ao R., a responsabilidade é somente deste e, portanto, somente este deve efetuar as obras necessárias de modo a que se faça o escoamento das águas de forma segura, sem acumulação que possa danificar outras frações ou partes comuns do prédio;
- e ainda, porque o R. efetuou ali obras, alterando aquela varanda o que criou defeitos na estrutura e, assim sendo, uma vez mais, somente a ele cabe a responsabilidade de reparação daquelas deficiências bem como solucionar os problemas que tal causou aos AA.
- conclui pela condenação do R. em repor a situação original, isto é, a reparar a fração à situação anterior dos danos causados pelo seu terraço, por via da responsabilidade extracontratual, pelo art. 562.º do CC, nomeadamente, os tetos e paredes e ainda os bens móveis que foram danificados por consequência.
É verdade que o art. 1421.º n.º 1. al. b) do CC define que os terraços de cobertura como parte comum, ainda que destinados ao uso de qualquer fração. No entanto, a letra do art. 1424.º n.º 3 do CC é bastante clara no que tange às despesas correspondentes, pois estipula que as despesas relativas às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem.
No que a este ponto concerne, o legislador é bastante claro. E portanto, assim sendo, em momento algum poderia ter cabimento que a responsabilidade pelo pagamento das obras fosse a encargo do condomínio ou da sua administração.
Ademais, é importante ver que, ficando provado pela perícia – como ficou – que as obras levadas a cabo naquela varanda foram mal executadas e que foi a partir daí que começaram a haver infiltrações que danificaram outra fração, muito menos se poderia conceber a possibilidade de qualquer responsabilidade de outro ente que não do próprio proprietário.
Assim não seria se, por exemplo, a este título veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido a 24/11/2020 no âmbito do proc. n.º 981/19.0T8CSC.L1-7, os danos causados na fração se devessem a infiltrações com origem na falta de conservação e reparação da zona comum.
Nesse caso, o condomínio e a administração do condomínio respondem pelos danos causados e, uma vez que sobre aqueles recai o dever de vigilância, conforme estipula o art. 493.º do CC, provando-se que houve uma conduta negligente e não foi observado aquele dever de zelo e cuidado que por lei são exigidos. Deste modo, consequentemente, o condomínio tem de indemnizar pelos danos causados por aquela omissão ilícita e culposa.
Feitas todas as considerações, a final, o acórdão ora em análise fez jus aquilo que é definido nos termos da Lei, não merecendo neste ponto que se viu qualquer crítica.