Cessação de contrato a termo certo: o que diz o Tribunal?


Cessação de contrato a termo certo: análise do Tribunal da Relação do Porto
O acórdão n.º 836/18.6T8AVR.P1, proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, aborda questões fundamentais sobre a cessação de contrato de trabalho a termo certo e os requisitos legais para a sua validade.
Factos do caso
A autora foi contratada pela Ré em setembro de 2016 mediante contrato a termo certo de seis meses, com funções de operária e salário de €750,00. A Ré comunicou a intenção de não renovar o contrato apenas a 6 de setembro de 2017, ou seja, sem respeitar o prazo legal mínimo de 15 dias. Esta tentativa de cessação de contrato fora do prazo acabou por desencadear um conflito jurídico relevante.
Após se aperceber do erro, a Ré tentou remediar a situação informando a autora da renovação tácita do contrato. A autora, no entanto, não aceitou tal renovação e deixou de comparecer, sendo considerada pela Ré como tendo abandonado o posto de trabalho.
A interpretação jurídica do Tribunal
Nos termos do artigo 236.º do Código Civil, a declaração negocial deve ser interpretada conforme um declaratário razoável. Assim, a autora interpretou legitimamente a comunicação da Ré, recebida tardiamente, como uma tentativa de despedimento, ou seja, uma forma irregular de cessação de contrato sem respeito pelas formalidades legais.
A Ré tentou posteriormente revogar a declaração, mas, segundo o artigo 224.º do Código Civil, a eficácia de uma declaração depende do momento em que chega ao destinatário. Neste caso, a carta chegou depois do prazo legal, o que impossibilitou a cessação de contrato nos termos pretendidos.
Consequências da comunicação extemporânea
A cessação de contrato fora dos moldes previstos na lei implica consequências jurídicas graves para a entidade empregadora. O contrato foi automaticamente renovado por igual período. A comunicação tardia da cessação, mesmo sem intenção de despedimento, produziu os efeitos jurídicos de um despedimento, por se traduzir, na prática, na cessação unilateral do vínculo sem causa válida e sem processo disciplinar.
O Tribunal referiu ainda jurisprudência anterior (Acórdão TRP de 8/11/2010) que confirma a irreversibilidade de uma declaração de cessação, a não ser com acordo entre as partes — o que não existiu neste caso.
Decisão do Tribunal da Relação do Porto
O Tribunal considerou a renovação tácita do contrato válida e interpretou a comunicação posterior da Ré como despedimento ilícito. Assim, confirmou a decisão da primeira instância, reafirmando os direitos da autora e a ineficácia da comunicação extemporânea da Ré.
Este acórdão reforça a importância de cumprir escrupulosamente os prazos legais na cessação de contrato a termo. A omissão pode ter consequências graves para o empregador, incluindo o reconhecimento de despedimento ilícito.

BQ Advogadas