O Impacto da Revogação da Lei n.º 31/2023, de 4 de julho na Insolvência Empresarial
Com o início da situação pandémica em março de 2020, surgiram novas exigências, especialmente no âmbito do Direito da Insolvência. Assim, a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, foi regida com o objetivo de preservar o tecido empresarial cuja solvência tivesse sido afetada pelos impactos económico-sociais. Contudo, esta legislação foi revogada recentemente, gerando implicações significativas. É necessário analisar criticamente essa revogação, tendo em mente os seus possíveis impactos e questionando a sua oportunidade.
A Lei n.º 1-A/2020 regulava a suspensão do prazo de 30 dias para a apresentação do devedor à insolvência (alínea a) do número 7 do artigo 6.º-E da Lei n.º 1-A/2020 em conjunto com o número 1 do artigo 18.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas). No entanto, com o término da pandemia de COVID-19, em maio de 2023, foi promulgada a Lei n.º 31/2023, de 4 de julho, que entrou em vigor em 5 de julho. Esta lei revogou diversas medidas adotadas no contexto da pandemia, introduzindo mecanismos específicos para a sua produção de efeitos. A revogação da suspensão do dever de apresentação do devedor à insolvência marcou o reinício da contagem dos prazos para a apresentação à insolvência, conforme estipulado no artigo 18.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Uma das consequências imediatas desta revogação é o retorno ao prazo original de 30 dias após a data de conhecimento da situação de insolvência, sob pena de insolvência culposa. Esta medida exige maior celeridade nas ações dos devedores, o que pode ser desafiador, especialmente para empresas ainda em processo de recuperação. Adicionalmente, empresas que haviam apresentado ao Processo Extraordinário de Viabilização de Empresas (PEVE), regulado pela Lei n.º 75/2020, de 27 de novembro, ficaram isentas da obrigação de apresentação à insolvência enquanto o processo PEVE estivesse pendente.
No entanto, as consequências dessa revogação fazem-se sentir de maneira notável. No mês de julho deste ano, as insolvências aumentaram em mais de 23% em comparação com o mesmo período do ano anterior, totalizando 286 casos. Essa drástica mudança no cenário empresarial é preocupante, especialmente considerando outros fatores de instabilidade, como a persistente guerra na Ucrânia, a inflação crescente (de 1,3% em 2021 para 7,8% em 2022[1]) e o abrandamento do comércio internacional.
Os setores mais atingidos, segundo a Iberinform[2], foram: a Indústria transformadora (21%); Construção e obras (16%); Comércio e retalho (11%); Comércio por grosso (12%). E relativamente aos distritos mais afetados, não é de estranhar que sejam Lisboa (27%) e Porto (23%), seguindo-se Braga com 9%; e Aveiro e Setúbal com 7%.
Torna-se inevitável questionar se a revogação da lei foi o passo mais adequado. Afinal, a pandemia terminou, mas outras crises persistem, incluindo a continuação da Guerra na Ucrânia, a inflação galopante e o declínio do comércio internacional.
Em suma, a revogação da Lei Pandémica trouxe consigo um aumento expressivo nas insolvências empresariais em Portugal, gerando preocupações quanto à sua oportunidade e aos seus impactos negativos no cenário económico do país.
[1]Cfr. Pordata, in https://www.pordata.pt/portugal/taxa+de+inflacao+(taxa+de+variacao+do+indice+de+precos+no+consumidor)+total+e+por+consumo+individual+por+objetivo-2315.
[2]Cfr. Iberinform, 04 de agosto de 2022 in https://www.iberinform.pt/noticias/detalle/insolvencias-ate-julho-baixam-mais-de-10-face-a-2021.